A compreensão do eixo que conecta o intestino ao cérebro ajuda a entender como a depressão, a ansiedade, a obesidade, as doenças neurodegenerativas e as doenças autoimunes estão ligadas.
Se você perdeu o entusiasmo, vive ansioso e a toda hora é invadido por uma onda de emoções descontroladas, relaxe. Afinal, você não é um caso perdido. Ao contrário, muito provavelmente faz parte de um grupo cada vez maior que sofre as consequências da relação, nem sempre cor-de-rosa, entre o intestino e o cérebro.
Não é de hoje que a ciência sabe que as bactérias intestinais têm receptores e produzem neurotransmissores que possibilitam uma comunicação direta com o cérebro por vias neurais, exatamente da mesma maneira como o nervo vago funciona.
Podemos comparar esse processo a uma espécie de linha telefônica muito complexa e de alta conectividade. Essa via de comunicação entre o intestino e o sistema nervoso é chamada de “eixo intestino-cérebro”. E, cada vez mais, as pesquisas têm comprovado que alterações nesse sistema estão diretamente ligadas a uma série de doenças, como depressão, ansiedade, distúrbios gastrointestinais, obesidade, dependências, doença de Alzheimer, Parkinson, esclerose múltipla e até mesmo o câncer. Bingo!
Esse processo foi muito bem muito descrito por Emeran Mayer no livro “A conexão mente-intestino”. Segundo ele, não apenas os micróbios intestinais possuem neurotransmissores que permitem a comunicação com o sistema nervoso central (SNC), como também estão perfeitamente posicionados no trato gastrointestinal para receber as informações do cérebro.
Isso quer dizer que até os seus ignorados micróbios intestinais entendem maravilhosamente bem os momentos em que você se sente feliz, estressado, ansioso ou com raiva, e imediatamente reagem de acordo. O pensamento que começa no cérebro gera um sentimento ou emoção que caminha direto para o seu intestino. Sentiu?
Por isso, aquela sensação que você normalmente descreveria como “alguma coisa em seu interior dizendo que algo está errado” não é apenas uma figura de linguagem e sim a percepção do enorme envolvimento das suas participativas bactérias intestinais ajudando na tomada de decisões que você classificaria como “intuitivas”.
Essa inteligência que você pode chamar de mil formas não é fascinante?
É claro que nessa relação de mão dupla assim como o humor influencia e causa alterações nas bactérias intestinais, as bactérias intestinais também mexem com o humor. E tudo isso impacta diretamente o seu extraordinário – e tão na moda – microbioma intestinal.
Um microbioma intestinal saudável está fervilhando com bactérias frenéticas que decompõem, absorvem e assimilam nutrientes dos alimentos que você ingere, fornecendo energia a todos os processos do seu corpo. Mas o trabalho não para por aí.
Agora vem a melhor parte: os micróbios intestinais também têm outra atividade muito importante, que é produzir serotonina e dopamina, substâncias químicas responsáveis pelo “sentir-se bem”, que contribuem para regular e melhorar o seu humor.
A interação intestino-cérebro é tão intensa que aproximadamente 90% da serotonina e 50% da dopamina são produzidos pelas bactérias do seu intestino.
Por isso, quando o intestino está saudável, tudo é alegria, por assim dizer. As linhas de comunicação entre o cérebro fluem perfeitamente. A serotonina é produzida em níveis adequados, os sinais de fome e saciedade são enviados no tempo certo, os nutrientes são sintetizados com eficiência e assim por diante.
Como resultado, você se sente energizado, calmo e de bem com a vida. Isso também contribui para responder melhor ao estresse mental e manter uma atitude mais equilibrada. E esse sentimento consistente e despretensioso de “feliz sem motivo” é o melhor sinal de boa saúde intestinal.
Mas nem tudo é harmonia na vida intestinal. Certos hábitos e fatores presentes na sua dieta, como comer muitos alimentos ricos em açúcares e carboidratos e/ou gorduras hidrogenadas, o seu estilo de vida ou medicamentos de uso contínuos frequentemente prejudicam as bactérias intestinais, suprimem a produção de serotonina e “alteram” por completo a comunicação entre o intestino e o cérebro. Essas alterações importantes da microbiota aumentam consideravelmente as chances de desenvolver quadros depressivos, de ansiedade crônica e outros distúrbios emocionais, assim como doenças neurodegenerativas e autoimunes.
A partir de agora, que você já sabe do impacto que este eixo tem dentro da nossa fisiologia, escolher os alimentos corretos, não utilizar medicamentos sem necessidade e desenvolver hábitos de vida saudáveis são determinantes para uma vida longa – e o mais importante, com qualidade!
Fontes:
- Gut-brain Axis: Role of Lipids in the Regulation of Inflammation, Pain and CNS Diseases. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28215162
- Unhealthy gut, unhealthy brain: The role of the intestinal microbiota in neurodegenerative disease. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30114473
- The Gut Microbiota and Alzheimer’s Disease. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/28372330
- Distinct Gut Microbiota Composition and Functional Category in Children With Cerebral Palsy and Epilepsy. https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fped.2019.00394/full